quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Nota sobre uma tragédia...


Depois da tragédia, enquanto muitos proclamavam o que juravam sentir, eu preferi o silencio da reflexão, do pensamento em ordem, do respeito aos que foram sem dizer adeus, aos que foram divertir-se e acabaram pisoteados, espalhados pelo chão...

Então eu segui por alguns dias rabiscando na mente, viajando e tentando organizar o que eu estava guardando no peito, pensando e repensando a cerca do teatro montado na rua, no lugar público, entre os que choram e os curiosos insensatos...

A mídia finge que se importa, o jornalista interroga e não se incomoda com quem se incomoda com os descaminhos da vida, não conforta quem responde sob lágrimas quentes a respeito do filho que não retornou a ligação. A notícia já vem remastigada, degustada e digerida, cedo e a toda hora. Em todos os canais da televisão e do rádio alguém comenta, alguém julga e o sensacionalismo banaliza o sofrimento...

E para os desconhecidos que proclamam o sofrimento, só posso me aperceber e confessar para o papel que acolhe, que essa “dor”, esse “sofrimento” irá se dissipar na mesma intensidade que se dissipa o interesse de informar. E se dissipará na mesma intensidade em que o ibope para de aumentar e quando logo surge outro escândalo, outra tragédia, outra exploração do sofrimento alheio em que todos, novamente, poderão se importar e irão se revoltar...

Porque o sofrimento da mãe, do pai, da namorada que fica, do irmão sem companheiro de quarto, do amigo que confidenciava essa é a dor que jamais dissipa, que o tempo não acaba, que é o “para sempre” para sempre e que não é pela metade. Porque para quem perde, não importa a forma: se foi no acidente de carro ou atropelado na calçada, na tragédia que ganha repercussão internacionais, ou da doença que se faz mais forte. Perder quem se ama não deixa muitas alternativas, deixa lágrimas e lembranças que nunca terminam, que nunca deixaremos terminar. E sabendo o que significa perder aqueles que amamos (e que se amará para sempre) é que me calo e respeito, opto por não vulgarizar o aperto que se sente no peito, nem pretendo subestimar os caminhos da morte.

Solidariedade interesseira não é necessária, sofrimento proclamado ao vento nem sempre é sofrimento, às vezes a densidade da dor fica a mercê do silencio, sem ato, mas existindo de fato... Enquanto a mídia busca dinheiro... Enquanto o ser humano especula o sofrimento alheio...

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Do tempo e da poesia...


Tenho descoberto nos últimos tempos que o tempo passa, que eu tenho passado e que os pássaros têm passeado pelos ares, mas acabam descendo e na minha chegada posso apreciar a vida calma: estão a saltitar pelo gramado, bebericam a água que já não está gelada...

Estamos todos a morrer, nascer é pouco, dançamos no compasso do tempo, do meu, do seu, do outro, tão singular e único para cada um, assim...

E eu, nessas vagas filosofias, doo fragmentos do meu tempo explicando à testemunha fiel, ao interrogar-me se acredito na Bíblia e se tive medo do fim do mundo, que não tive medo que o mundo de esvaísse num pedaço do tempo. Eu não tive medo, pois sabia que o fim do meu mundo, no seu tempo chegará, quando assim tiver de ser e que será pontual, sem atraso ou demora... Já não tenho medo, terei do mundo o tempo que será somente meu ter, depois, eu saberei dizer adeus...

Agora, sem demora estou no caminho e eu mesma escrevo minha história, dias sem glórias, dias que fazem memórias enquanto o resto passa... Abro e fecho os olhos, navego quando assim me apetecer, eu tenho meus tormentos e não é ruim estar sozinha, sei ao que devo recorrer, sei quem devo socorrer...  Sei das paixões e dos amores, dos que vieram, dos que não passaram, de quem não se despediu, de quem sumiu e não faz falta... Mas sabor de verdade é quando despimos e mostramos a alma em forma pura, assim, como voar frente ao penhasco, ir... Caberá o riso ou o choro, mas o que vale é sentir...

Estou desarmada e viva, continuo andando e carregando palavras, continuo crendo no que não se pode mais acreditar, só assim posso me guiar. Sonhos nunca são demais e a mim não faz mal crer em utopia, porque o que eu quero é magia, cerveja, beijos de amores idos e vindos, dos que não voltaram mais, boemia. Porque querer falsas alegrias se tudo acaba um dia?... Eu quero ter, eu quero ser a poesia...

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Sem pertences e sem pertencimento...


Não pertencer a lugar algum, sentir o corpo enfraquecer aos poucos... Distante do mundo, trancafiada entre quatro paredes quentes posso deixar-me levar pela melancolia enquanto degusto lentamente tardes de silêncio, da ânsia que aguarda o choro que não vem...

Volto à terra do passado, volto para onde não quero estar, me visto com as roupas que não quero usar e uso as falas que se deve falar...

Não há para onde correr, velhas histórias continuam por aí, deve ser normal, às vezes, sentir vontade de morrer, como virar as costas sem dizer adeus, fechar a porta e deu... Ainda lembro o que posso esquecer...

Sei que não pertenço a lugar algum, aqui nada ficou, fui sem sobras... Lá continuo pensando para onde vou, interroga-me a constante insatisfação que se em algum pedaço de chão vou parar... Vou como nômade, sou andarilho sem trocado no bolso, riscando livros, divagando... Sentindo que, de repente, tudo está no lugar errado e a vida não deveria ser a estátua da praça, entres dias de chuva pesada e o sol que racha, sempre intacta...

De repente, volto às canções que me acompanharam em outras noites, estou outra vez entre quatro paredes que me interrogam e me torturam, não acalentam nem ajudam... Fico entre a música e o som do ventilador... Sem passos, sem rumo, apenas, perto da cama, estão os chinelos grandes demais para meus pés...

Não tenho lágrimas nem planos, tenho agora poucos livros e ainda tenho sonhos... Amores loucos já não sabem para onde foram, fico com a noite de pouco sono...  Fico só... Sem futuro, ando só... Vou sem pertences e sem pertencimento... Sem merecimento voo e só...

domingo, 20 de janeiro de 2013

Porque escrevo...


Como se não houvesse outro caminho, outro destino, outra sina, outro rumo já traçado, já riscado, mencionado ou planejado, escrevo... Mesmo no escuro, ouvindo o vento, de porta fechada e maquina de lavar ligada... Escrevo porque lançar palavras é ter pulsação, é saber que a vida acontece e corre... É compreender que não se pode fugir daquilo que se é... Escrever é o ar que preciso para sobreviver...

E assim, sem tempo, contratempo, meio termo, compasso e descompasso, debruço-me sobre pedaços de papel largados ao acaso e escrevo, já não posso fugir de mim, nem esquecer que pretendo morrer de fome e escrever: memórias, criações imaginárias, invenções, poesia da alma, outras histórias...

Depois de tantas tentativas de frustradas, de fugas fracassadas, recaídas e ressacas, aceito... Volto e escrevo...

Mas agora, hei de ter sempre palavras flutuando pelo (meu) universo e um retalho em branco por perto, e uma caneta, um lápis, um giz de cerra ou até mesmo um pedaço de tijolo que me permita riscar a calçada, que me permita viajar no espaço, estar fora desse mundo e estar salva da loucura doentia, psicopatia... Assim continuarei a respirar e serei capaz de sobreviver...

Que a poesia, a escrita, as histórias ou as palavras continuem sendo o remédio capaz de curar, de salvar...

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

O que vou fazer?



E agora? O que você vai fazer da vida? O que você vai ser agora?

Não bastando às perguntas da minha alma que não descansa, o mundo faz de mim campo minado, e mina minha existência, bombardeia-me com todas as interrogações que pode lançar sobre um pedaço de terra num lugarzinho qualquer do planeta...

E se quer realmente saber, o que vou fazer da vida nos próximos dias, nos próximos meses ou pelo resto da vida, continuarei a dizer “não sei”, porque se resolver admitir que eu esteja preparando as armas, que estou indo para a batalha, estou indo pintar o asfalto, resgatar cães, dar de comer aos leões aprisionados, se admitir que quero resgatar os animais engaiolados ninguém irá entender...

Eu não estou preocupada com o banquete de amanhã, nem em quanto terei no banco nos próximos anos, não estou pensando no apartamento de luxo, nas reuniões sociais que serei convidada, nem em férias internacionais ou em chiques restaurantes...

Estou pensando em não abandonar o que sou, o que quero ser... Estou pensando em não envergonhar os planos da infância...

Estou pensando no que vou fazer para abolir do mundo vitrines de animais, estou pensando que não desejo que os sobrinhos, que um dia terei, precisem entrar numa loja de animais. E que eles saibam que amizades não se compram e que animais não são objetos e que eles não precisam se preocupar com o mundo interrogando o que eles vão fazer da vida...

Estou pensando que é preciso lutar sem armas, mas que há quem seja preciso salvar... E eu, eu não vou escapar, nem vou me acorrentar aos anseios do mundo... 

Por fim, pode ser que eu não saiba do muito que quero fazer, mas eu sei o que não quero ser...


domingo, 13 de janeiro de 2013

Do que resta...


Quando silêncio se rompe,
Quando o segredo se revela,
Quando se atravessa a ponte,
Quando se desfaz a amizade,
Já não se pode voltar,
Já se voltou para a Terra do Nunca...

Abriram-se os portões,
E agora,
Depois que os trilhos ali nos deixaram,
Entre chuva e nascer do dia,
Agora somos nós,
Com o poder nas mãos para decidir,
Continuar a história ou fechar os portões para sempre
E partir...

Não precisamos fugir,
O voo é para ser intenso,
De repente, resolvamos pintar o céu de vermelho,
Verde ou cinza...
Mas isso não importa,
O que quero é estar junto e sem demora,
Sem pressa nem hora...

Fora isso,
Palavras não sobraram,
Mas no coração,
O que existe de maior permanece intacto,
(sempre permanecerá),
Como os anos passados,
Como nossos retratos,
Como nossa essência,
Dias que foram amados...

Amar é o maior de todos os poderes...

Depois de ter queimado o medo
E ter varrido as dúvidas,
Trago o mundo no meu riso, já conheci o pranto...

Há que se levantar a bandeira sabendo do peso.
Continuo gritando baixo,
Deixo com você à calma,
Não tenho nada do além...

Sou o que serei...
Não tenho a eternidade,
Não tenho planos,
Tenho sonhos,
Sono,
Tenho um retalho da história
Sem glória, sem poder...

Tenho na memória a noite que fez dia
E, por fim,
Tenho perguntas sem respostas,
E a poesia simplória,
Que vem e vai sem demora,
E consola...

Tenho a miragem,
Tenho sentidos e sentimentos...
Desconheço o que terei amanhã:
Segredo revelado,
Dúvida dissipada,
Mãos unidas,
Multidão ou a réstia da luz...

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O mundo intacto...


Falo do que julgo injusto,
Julgo sem nunca ter sabido julgar,
Julgo por que agora aprendi a falar...
Mas não a lhe falar...
Acabo sempre calando,
Guardando o que nunca se conseguiu acabar...

Eu que nunca entreguei na bandeja
Os pingos da chuva que não molharam,
Deixei que a manhã lhe levasse
Pra minha terra,
Para o meu planeta...

Só com você deixei-me voar,
Deixei-me, livremente,
Fazer a poesia flutuar
E divagar pelos caminhos que quisesse estar...

Retorno sem beber vinho tinto,
Retalhos de sono,
Reflexo da noite em claro:
Bar, violão, mão,
Chuva...

Dos pingos que não molharam
Transformaram-se as lágrimas que rolaram.
E nos meus braços gelados,
Há de perdurar no tempo
O toque quente...

Então,
Segura firme,
Juntos, estamos em casa,
Lado a lado sabemos o que é ter lar...

Na Terra do Nunca o mundo também pode acontecer...
Há de se espera o dia nascer...
Eu não espero dizer adeus...
Não quero dizer adeus.
Quero saber da visão que você teve de cima,
Vou abanar e dizer “Olá”...

E eu, que sentimentalmente a ninguém pertenci,
Perdi,
Divago entre rosas e espinhos,
Mas tão livre me faço,
Que eu só quero voar,
Sem saber onde vou dar,
Sem saber se haverá neblina,
Dias cinzas,
Trovoadas e ventanias...

Os anos, eu os vi...
E as canções, agora, aqui,
Guardam o nosso planeta,
Ele, intacto, novamente,
Ficou...
É apenas o começo...