As folhas em branco sobre a mesa eu as uso agora para
anotações pessoais, para fragmentos de livros, para as anotações depois de cada
sessão.
As folhas brancas sobre a mesa já não as uso para anotações
de aula, para frases decoradas, profanadas por quem se coloca a frente, no
degrau mais alto da sala, declamadas com as mesmas vírgulas a cada novo
semestre... As folhas brancas, eu as deixo em casa, não levo para receberem em
suas linhas, datas de provas, nomes importantes, artigos, explicações que não
se aplicam. As folhas em branco, eu não as desperdiço com o que não é
importante mais.
As folhas brancas sob a mesa agora recebem em caneta dourada
a minha própria fala.
Em baixo de um livro de mil páginas estão as folhas
brancas esperando a descrição dos meus personagens, esperando a descrição dos
lugares, esperando as histórias que existem, que se movem em mim...
As folhas em branco estão sobre a mesa, à baixo de um
livro pesado de capa dura. Uma grandiosa obra da literatura...
As folhas brancas com linhas azuladas claras esperam
sobre a mesa, à baixo do livro pesado. Esperam até o momento de eu puxar e ter
em meio aos dedos uma folha solta. Esperam até eu empunhar a caneta de tinta
dourada. E esperam até me debruçar sobre ela, até fazer chegar a mão e depois à
folha branca todo o universo, todo o realismo fantástico que existe, que se
move e que se cria em mim...